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Publicado em Aug. 23, 2007, 9:24 p.m. - Notícias Fitrae

Fator idade e suposta generosidade distorcem debate sobre Previdência

Fator idade e suposta generosidade distorcem debate sobre Previdência

Por: Assunta Di Dea Bergamasco*



Pretensos analistas da questão previdenciária, com boa acolhida por parte da grande mídia, insistem que a previdência social tem dois graves problemas. O primeiro seria que a Previdência concede direitos em demasia, o que determinaria um alto custo para a sociedade brasileira. A segunda grande distorção, por não levar em conta todos os fatores implicados, é de que o sistema estipula exigências para acesso às aposentadorias e pensões em desequilíbrio com o perfil demográfico da sociedade. Isso faz surgir o falacioso argumento de imposição de uma idade mínima para a aposentadoria. Convém lembrar que essa simplificação em torno de uma “idade mínima” não considera os reflexos danosos por não levar em conta que o Estado, pelas peculiaridades do País, estará enganosamente “economizando” mas na realidade agravando a questão social e, em decorrência, sobrecarregando ainda mais as contas públicas e produzindo mais injustiça social.



Essas distorções são insistentemente alardeadas como fato verdadeiro, não por mero acaso. Tentar estabelecer a premissa de que a previdência deva ser analisada e reformada exclusivamente sob essa ótica diminui as possibilidades de efetiva solução, uma vez que a realidade não é devidamente esclarecida. Se, ao contrário, o foco estivesse centralizado na baixa cobertura previdenciária – hoje situada em 47% dos trabalhadores ocupados – a discussão passaria a se estabelecer em torno de medidas para ampliar o acesso à previdência social, o que implicaria melhorar a arrecadação e contemplar o diversificado perfil dos potenciais segurados.



Em visita que fez à ANFIP quando se multiplicaram as especulações sobre a reforma, o professor Cláudio Dedecca, da Unicamp, manifestou a opinião de que está havendo falta de seriedade na discussão sobre o limite mínimo de idade para a aposentadoria. Quando se verifica que o trabalhador brasileiro, pressionado pelo fantasma do redutor a que será submetido no cálculo de sua aposentadoria em decorrência do fator previdenciário, está sendo forçado a permanecer mais tempo no mercado de trabalho, ainda que, muitas vezes, sem condições de saúde para isso, a conclusão é de que efetivamente a perda de tempo com essa discussão sobre idade é bem maior do que a seriedade que deveria prevalecer no debate sobre tema de conotação social tão acentuada.



As alegações centradas na questão demográfica não levam em conta que “viver mais” não significa necessariamente que as pessoas em idade avançada tenham plena saúde. Na faixa etária de 50 a 64 anos, por exemplo, 64,5% do total (aproximadamente dois em cada três contribuintes) têm diagnóstico médico de portadores de uma ou mais doenças crônicas. Na faixa superior, de 65 anos ou mais, 77,8% têm pelo menos uma e 51,1%, pelo menos duas doenças.



Além das questões de saúde, é preciso ainda olhar o mercado de trabalho. A previdência social é responsável por assegurar renda para os trabalhadores que perdem a capacidade laboral. Por isso, além do aspecto demográfico, os debates sobre a previdência necessariamente envolvem o perfil do mercado de trabalho. E isso vem sendo solenemente ignorado pelos fabricantes de mitos, que defendem idéias inviabilizadoras de um modelo correto de Previdência para o país.



Se de um lado o conjunto da sociedade está vivendo mais, é preciso levar em conta que o mercado de trabalho brasileiro não está adaptado a essa transformação. Exigir idades mais avançadas como requisito para a aposentadoria é condenar um enorme contingente de pessoas ao subemprego, a uma desgastante condição de trabalhar, mesmo doente ou com restrições, sendo que essas enfermidades tendem a se agravar, piorando as condições de vida dessas pessoas, que também estão sujeitas a adquirir outras doenças – o que naturalmente ampliará os gastos públicos com o atendimento à saúde desses trabalhadores em idade avançada.



Além disso, transformou-se num reincidente vício por parte de certos “analistas” simplesmente comparar as regras previdenciárias dos mais diversos países, sem levar em conta as condições a que estão submetidos os respectivos trabalhadores. Em sociedades de economias mais avançadas, há uma maior presença do setor de serviços na economia. A imensa maioria da população tem altos níveis de escolaridade, as diferenças salariais e de renda são extremamente significativas se comparadas aos baixos níveis salariais no Brasil, do que resulta que as condições de vida e de saúde nesses países são muito mais satisfatórias e uniformes. Nesse contexto, pode-se estabelecer uma idade mínima universal para o acesso aos benefícios previdenciários. Para o Brasil, a exigência de uma idade mínima para a aposentadoria - que em todas as propostas em discussão é de 65 anos ou mais – é extremamente injusta e contribui para aprofundar ainda mais as desigualdades.



As pessoas de baixa renda em idade avançada estarão praticamente condenadas a ocupações no mercado informal, sem condições de continuar contribuindo para a previdência social. Assim, é profundamente injusto e, portanto, descabido que as reformas com o intuito de promover a melhoria das contas da previdência não se pautem pelo aumento da arrecadação do sistema, mas, tão somente, por meio da criação de regras impeditivas do acesso aos direitos previdenciários. Seria uma forma execrável de pretensamente diminuir o gasto com a previdência. Além de todos esses aspectos, é fundamental lembrar que a introdução do requisito de idade mínima prejudica sobretudo a parcela mais pobre da sociedade.



A conta da reforma somente fecha, sem medidas de inclusão e sem implementação da pluralidade das fontes de financiamento, se, por mecanismos diversos, como introdução de novos requisitos, carências, critérios e métodos de cálculo do valor dos benefícios, uma imensa maioria de idosos for excluída do seu direito previdenciário, muito além do que ocorre hoje. E isso – nem é necessário dizer – seria uma medida draconiana, absurda por dispensável e completamente ineficaz, agravada pelo seu altíssimo custo social. Previdência é investimento no cidadão. Reformar a Previdência com base em falsas premissas significa o aprofundamento das injustiças sociais e a criação de novas despesas, que somente serão evitadas caso os falsos analistas deixem a reforma da Previdência a cargo dos que realmente entendem do tema e que não defendam propostas impulsionados tão-somente por interesses inconfessáveis.



Assunta Di Dea Bergamasco é presidente da ANFIP – Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil

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