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Publicado em May 26, 2014, 8:02 a.m. - Notícias Fitrae

Antônio Queiroz: Sindicalismo e globalização

Compreender os elementos estruturais, tanto os de ordem econômica quanto tecnológica, bem como identificar as estratégicas e táticas adotadas pelo mercado, pode ajudar no enfrentamento à estratégia do patronato internacional. O desafio é grande e permanente.


Antônio Augusto de Queiroz*


Após participar, como palestrante, de importante Seminário Internacional sobre Sindicalismo e Globalização, realizado pela UGT na cidade de São Paulo nos dias 28 e 29 de abril em comemoração ao Dia do Trabalhador, resolvi compartilhar um pouco do que falei e muito do que ouvi sobre o tema.


A primeira e principal constatação é que a lógica do mundo globalizado, no que se refere às relações de trabalho, é de desregulamentar direitos e regulamentar restrições, com ataques às entidades sindicais e à regulação do trabalho.


O objetivo do capitalismo global, ao fim e ao cabo, é a redefinição do papel do Estado, a partir do esvaziamento da política e das prerrogativas estatais, de tal modo que o mercado se transforme no regulador e no promotor do desenvolvimento, numa verdadeira restauração conservadora e a desestruturação do poder.


A base teórica e material da nova ordem internacional foi a revolução científica e tecnológica e dos transportes e das telecomunicações, bem como a financeirização global da economia e a ideologia neoliberal.


A automação, a robotização, a reengenharia, a qualidade total, a substituição do trabalho formal pelo informal, a rotatividade e a terceirização são produtos dessa nova base teórica e material, que tem sido utilizada diuturnamente para fundamentar a redução de custos e aumentar a produtividade.


Nova ordem
A nova ordem, portanto, passa por maior competitividade e lucratividade, pela desregulamentação e pela dominação do capital financeiro e, principalmente, por um processo de reestruturação produtiva de bens e serviços.


As reestruturações, muito fortes nas décadas de 1980 e 1990, ainda permanecem, como a alta informalidade (trabalhadores sem proteção social), baixos salários e geração de ocupações em segmentos que não asseguram as melhores condições de trabalho.


As empresas também passaram a disputar a lealdade do trabalhador frente a outras instituições, como é o caso do sindicato, do Estado e até de outras organizações.


Valem-se, para tanto, da ideologia de criminalizar a ação coletiva e da cultura de que o trabalhador é quem deve se tornar empregável ou empreendedor. Ou seja, além de propagar a cultura do individualismo, passa a ideia de que a solução dos problemas do trabalho é de responsabilidade das pessoas e não da estrutura social, econômica e política.

Financeirização
As transnacionais se pautam pela financeirização e se organizam em cadeias produtivas, definem os territórios ou promovem a desterritorialização e fragmentação da produção, mas não deixam claro onde estão localizados os centros de poder ou o lócus decisório.

A estratégia varia de acordo com a conjuntura mundial e segundo a conveniência de aumento da lucratividade, ora optando por grandes fusões e incorporações, ora pulverizando ou fracionando a produção.

A tática, para enfraquecer as entidades sindicais, tem sido a divisão da empresa em centenas de unidades esparramadas pelo mundo. O número de empregados em cada unidade não passa de 20 mil. 

Promovem, frequentemente, o deslocamento físico da produção e, como regra, procuram se instalar em países com mão de obra barata e sem organização sindical forte, como o continente Asiático, para fazer dessas unidades a referência em termos salariais, de benefícios e relações trabalhistas.


Brasil
Só em situações excepcionais, como o caso do Brasil, cujo mercado interno é muito forte, as empresas multi ou transnacionais convivem com legislação trabalhista e sindical por elas consideradas rígidas, mas atuam permanentemente para modificá-las.


Quando os salários ficam elevados, em algumas plantas, ameaçam fechar a fábrica, forçando os trabalhadores a renunciarem a direitos, além de fazerem lavagem cerebral nos trabalhadores quanto aos sindicatos, considerados por eles uma coisa nociva aos interesses dos trabalhadores.


As empresas mudam de dono ou de acionista controlador como se troca de roupa, deixando perplexos os trabalhadores.

Identificar os reais interlocutores globais e os centros decisórios é um desafio do movimento sindical global.


Paralelamente a isto, existe também a dificuldade de representação do teletrabalho ou daqueles que praticam o trabalho imaterial ou trabalho à distância.


Desafios
Nesse cenário, o desafio do movimento sindical global é construir estratégicas capazes de enfrentar: 1) a desnacionalização das empresas, e 2) a hegemonia do sistema financeiro.


A consequência desse modelo, que tem contado com a coordenação integrada das agências internacionais (Banco Mundial, FMI, OCDE, etc), foram a crise do socialismo no Leste Europeu, do Estado de bem-estar social e o avanço do neoliberalismo, propiciando as condições ideais para a prevalência do sistema financeiro sobre o setor produtivo, que provocaram a crise de paradigma na gestão e na organização do trabalho.

Assim, enquanto os trabalhadores forem formados ou treinados com base nos princípios dessa nova ordem, inclusive por instituições patronais, como o “Sistema S” aqui no Brasil, eles serão doutrinados para agir exclusivamente pautado pela competitividade e de forma individual e egoísta, quando deveriam também incorporar valores coletivos e solidários.


Por isso, a capacitação, a qualificação e o treinamento dos trabalhadores pelos próprios trabalhadores é mais que importante, é fundamental para enfrentar essa investida em bases neoliberais.


Unidade
A unidade de ação no plano nacional e o fortalecimento do movimento sindical no plano internacional também são fundamentais nessa luta.


Além disto, no caso brasileiro, é preciso defender a legislação de proteção social e ocupar todos os espaços institucionais nos quais haja debate sobre temas que afetem a organização sindical, os direitos trabalhistas e previdenciários dos trabalhadores.


A estratégia patronal é desmontar o sistema de proteção sindical e social dos trabalhadores. As 101 propostas da CNI com vistas a eliminar, reduzir ou flexibilizar direitos, garantias e prerrogativas asseguradas em lei ou em enunciados e súmulas de tribunais aos sindicatos e aos trabalhadores fazem parte dessa estratégia.


Quando bem-sucedida, a estratégia patronal – que leva ao desemprego, a precarização e a informalidade – tem como principal consequência (1) a redução da legitimidade sindical, (2) a perda de capacidade de mobilização, (3) as baixas taxas de sindicalização, (4) a redução dos espaços de intervenção sindical na política, (5) o declínio no número de greves; e (6) o aumento da dificuldade para manter ou ampliar benefícios conquistados via negociação coletiva.


Causas da crise
Na opinião de Andreia Galvão, em “Novas estratégias e formas de organização sindical”, texto distribuído durante o seminário internacional sobre sindicalismo contemporâneo promovido pela UGT, as causas da crise do movimento sindical internacional tem origem: 1) nas novas formas de organização e gestão da força de trabalho; 2) na ideologia neoliberal, que estimula o individualismo e a competitividade, enfraquecendo a solidariedade; 3) nas mudanças na legislação trabalhista e adoção de novas formas contratuais que reduzem direitos; e 4) nas reformas pró-mercado (previdência, do Estado, privatizações etc).


Por fim, Frege e Kelly (2003), citado no mesmo texto da professora Andreia Galvão, identificaram cinco tipos de estratégias utilizadas pelos sindicatos para enfrentar a crise: 1) organizar e se reorganizar para ampliar a representatividade sindical (fusão, por exemplo); 2) aumentar o número de filiados; 3) alcançar segmentos não sindicalizados e fortalecer a representação no local de trabalho; 4) coalizão com outros movimentos sociais; 5) parceria com empregadores, para reduzir a imagem negativa, associadas à conflituosidade; 6) ação política, para influenciar a legislação; e 7) cooperação internacional. O item “5”, entretanto, não parece apropriado para uma entidade representativa dos trabalhadores.


Compreender os elementos estruturais, tanto os de ordem econômica quanto tecnológica, bem como identificar as estratégicas e táticas adotadas pelo mercado, pode ajudar no enfrentamento à estratégia do patronato internacional. O desafio é grande e permanente.


(*) Jornalista, analista político, diretor de Documentação do Diap

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